Tania Moreno Fernandes&nbsp Tathyane Trajano Barreto&nbsp Bruno Nascimento Barreto&nbsp

Relatório de Caso

DOI: 10.5935/2525-5711.20200004

Relatório de dois casos de quimioterapia esfoliativa e breve revisão de literatura

Tania Moreno Fernandes; Tathyane Trajano Barreto; Bruno Nascimento Barreto

Universidade Federal do Vale do São Francisco, Disciplina de Dermatologia.Colegiado de Medicina – Petrolina – PE – Brasil

Autores correspondentes: Correspondência para:
Tania Moreno Fernandes
E-mail: [email protected]

Artigo recebido em 19 de janeiro de 2020
Artigo aceito em 24 de julho de 2020

ABSTRACT

Quilite esfoliante é uma doença rara da pele que não há consenso sobre sua fisiopatologia, curso clínico e tratamento. Ela pode causar problemas funcionais e estéticos, estando associada a distúrbios psiquiátricos e/ou emocionais. Nosso objetivo é relatar dois casos de pacientes com quilite esfoliativa e fornecer registros para a literatura limitada. Os resultados obtidos com Prednisona, bálsamo labial, extrato fluido de Chamomila recutita e Dexpantenol, associados ao cloridrato de Imipramina, foram satisfatórios. Dois anos depois, não houve recidiva do quadro clínico nos dois pacientes, mesmo sem nenhum tratamento.

Keywords: Quelite; Doença cutânea; Lábio

O que já se sabe sobre este tema?
Embora não haja consenso sobre sua fisiopatologia, curso clínico e tratamento, a Quelite Esfoliante é uma doença cutânea rara e inflamatória que afeta os lábios. E pode causar problemas funcionais e estéticos, estando associada a distúrbios psiquiátricos e/ou emocionais.
O que este estudo acrescenta?
Os tratamentos utilizados foram eficazes, conseguindo a regressão das lesões, melhora clínica e ganho de peso, impactando na vida dos pacientes.
INTRODUÇÃO
A Quilite Esfoliante (CE) é uma doença inflamatória que afeta a região entre a pele e a mucosa dos lábios1-9, principalmente os lábios inferiores1,6,8. Ela pode ser apresentada como eritema, descamação irregular, fissuras labiais e crostas hemorrágicas1,2,5-9. Os pacientes afetados pela CE podem desenvolver problemas funcionais (alimentação e fala) e estéticos, levando ao isolamento social1,4-8. A etiologia e patogênese desta condição ainda são desconhecidas2-6, 8,9, embora várias fontes de estudos relacionem a CE com o hábito de lamber ou morder os lábios1,2,4-9, ou com o mecanismo patogênico da psoríase7.
Este relato de caso tem como objetivo descrever dois casos de pacientes com CE e fornecer à literatura informações sobre o curso do afeto e sua terapia empírica.

Relatório de caso 1
Fêmea, 41 anos, melanodérmica, residente em Petrolina – PE (Brasil), apresentou uma fissura no canto direito do lábio inferior que apareceu dois anos antes da consulta. A lesão, inicialmente restrita, disseminou-se para todo o lábio inferior, com tênue descamação e fissuras. Posteriormente, a paciente apresentou crostas amareladas e dolorosas no lábio inferior e descamação na borda inferior do lábio superior. Os ciclos entre a queda das crostas e o aparecimento de novas crostas duraram cerca de sete dias. A doença desperta devido a um ambiente de trabalho angustiante onde o paciente foi inserido. Ela referiu-se a uma ligeira perda de peso no início da doença devido à dificuldade de comer. Ela também negou alcoolismo, tabagismo ou outra condição médica relevante.
Nos últimos dois anos, a paciente foi submetida a várias terapias ineficazes (Tabela 1).

No exame físico, a paciente parecia depressiva e apreensiva, apresentando o lábio inferior coberto por crostas amareladas, espessas e aderentes com manchas hemorrágicas. O lábio superior apresentava uma tênue descamação e eritema (Fig. 1A).


Figure 1. A. Crostas amareladas, espessas e aderentes com manchas hemorrágicas. O lábio superior apresentava uma ténue descamação e eritema. B. Prednisona apresentou excelentes resultados um mês após seu início C. Houve recidiva da descamação interposta com tecido sadio nos lábios superior e inferior, sem sangramento. D. Hiperqueratose paraqueratósica com infiltrado inflamatório misto.

O paciente foi tratado com dexpantenol tópico (pomada), extrato líquido de Chamomila recutita e prednisona (40mg/dia), associado ao cloridrato de imipramina (75mg/dia).
O tratamento com prednisona apresentou excelentes resultados um mês após o seu início (Fig. 1B). Sete dias após a suspensão do corticosteróide, com a manutenção da medicação tópica, houve recidiva da descamação interposta com tecido sadio nos lábios superior e inferior, sem sangramento (Fig. 1C).
Os resultados dos exames complementares e da biópsia são apresentados na Tabela 2 e na Figura 1D, respectivamente. Esses resultados sugerem o diagnóstico de quelite esfoliativa.

Relato de Caso 2
Fêmea, 33 anos, caucasiana, residente em Filadelfia – BA, queixou-se de uma lesão em todo o lábio inferior que surgiu há um ano, inicialmente com descamação, queimação e prurido, evoluindo depois para crostas amareladas. Os ciclos duravam cerca de oito dias. A lesão surgiu devido a uma situação angustiante causada pela morte de um parente. Ela mencionou a perda de peso causada, principalmente, pela dificuldade de comer. Ela também relatou hábito de lamber os lábios, febre vespertina durante 2 dias, parestesia nas mãos e sangramento labial. A paciente negou alcoolismo, tabagismo e outras condições médicas relevantes.

No exame físico, a paciente apresentou tristeza, além de crostas amareladas e espessas sobre um fundo eritematoso no lábio inferior (Fig. 2A). Após o uso de prednisona durante dois meses, a lesão regrediu, tornando-se limpa e eritematosa (Fig. 2B). Foi detectada uma higiene bucal inadequada.


Figure 2. A. Crostas amareladas e grossas sobre um fundo eritematoso no lábio inferior . B. Após o uso de prednisona por dois meses, a lesão regrediu, tornando-se limpa e eritematosa C. Houve recidiva da descamação interposta com tecido sadio nos lábios superior e inferior, sem sangramento, D. interrupção da mucosa associada à inflamação linfocítica crônica.

Os resultados dos exames e biópsia são apresentados na Tabela 2 e Figura 2C – 2D, respectivamente.
No último ano, o paciente foi submetido a várias terapias sem sucesso. Atualmente está sendo tratada com prednisona (40mg/dia) com retirada progressiva, omeprazol (20mg/dia), extrato fluido de Chamomila recutita e protetor solar labial, associado ao cloridrato de imipramina (75mg/dia).
DISCUSSÃO
Embora a literatura sugira um maior envolvimento de mulheres, relatos recentes evidenciam uma predominância equilibrada entre homens e mulheres1-9. Relatos recentes também concordam com a revisão da literatura de Almazrooa et al. (2013)5, que indica uma média de 59 anos de idade entre 15 pacientes (2/3 das mulheres).
Sobre o ciclo da doença, Mani e Shareef (2007)1 descreveram um padrão de renovação tecidual com 10 dias de duração. No caso 1, o ciclo durou sete dias e no caso 2, oito dias.
Embora desconhecida uma etiologia e patogênese, vários estudos e o caso 2 indicaram uma relação entre a doença e o hábito de lamber os lábios4,5,7-9. Entretanto, relatos de Mani e Shareef (2007)1, Roveroni-Favaretto et al. (2009)2, Pigatto et al. (2011)3, Nayaf (2014)6 e o caso 1 não confirmaram essa associação.
A condição tem um aspecto desfigurante, prejudicando a estética e as atividades funcionais, implicando em exclusão social ou distúrbios psiquiátricos 1,4,5,8 e exigindo então o uso de antidepressivos, fato evidenciado em nossos relatos.
Terapias transversais estão sendo utilizadas no tratamento da CE, como corticosteróides sistêmicos e tópicos, antifúngicos, antibióticos, imunossupressores, imunomoduladores, queratolíticos, protetores solares, emolientes, crioterapia, terapias laser e UVB, fitoterápicos, antidepressivos e/ou psicoterapêuticos1,2,4-9. Em ambos os casos, os tratamentos utilizados foram eficazes, conseguindo a regressão das lesões, melhora clínica e ganho de peso. Embora a recidiva das lesões no caso 1 após a suspensão da prednisona, ambos os pacientes se beneficiaram do uso do cloridrato de imipramina, apresentando melhora emocional.
*** Após um acompanhamento de 2 anos em ambos os pacientes, observou-se melhora no perfil emocional dos pacientes e resolução da condição,
O conhecimento sobre a fisiopatologia e o tratamento ainda é insuficiente devido à escassez de informações na literatura (Quadro 1). A falta de consenso, além dos inúmeros distúrbios causados por esta doença, faz deste relato uma importante fonte de informações adicionais sobre esta condição e suas repercussões na vida dos pacientes.
1. Barakian Y, Vahedi M, Sadr P. Quilite esfoliativa: um relato de caso. Avicenna J Dent Res. 2015;7(2):e24943.
2. Connolley M, Kennedy C. Quilite esfoliativa tratada com sucesso com tacrolimus tópico. Br J Dermatol. 2004 Ago;151(1):241-2.
3. Mani SA, Shareef BT. Quilite esfoliativa: relato de um caso. J Can Dent Assoc. 2007 Set;73(7):629-32.
4. Nayaf MS. Cheilite esfoliante de um paciente do sexo masculino – relato de um caso. Nosso Dermatol Online. 2015;6(1):39-42.
5. Roveroni-Favaretto LH, Lodi KB, Almeida JD. Calendula officinalis L. Quilite esfoliativa tratada com sucesso: um relato de caso. Casos J. 2009 Nov;2(11):9077.
6. Almazrooa SA, Woo SB, Mawardi H, Treister N. Caracterização e tratamento da quilite esfoliativa: uma experiência unicêntrica. Oral Surg Oral Med Oral Pathol Oral Radiol. 2013 Dez;116(6):e485-9.
7. Gupta S, Pande S, Borkar M. Quilite esfoliante devido à mordedura habitual dos lábios e excelente resposta ao metotrexato. Panacea J Med Sci. 2012 Jun;2(1):37-8.
8. Pigatto PD, Berti E, Spadari F, Bombeccari GP, Guzzi G. Photoletter ao editor: quilite esfoliativa associada a implantes dentários de titânio e amálgama de mercúrio. J Dermatol Case Rep. 2011 Dez;5(4):89-90.
9. Bhatia BK, Bahr BA, Murase JE. Terapia com laser de excímeros e terapia de banda estreita ultravioleta B para quimioterapia esfoliante. Int J Womens Dermatol. 2015 Jun;1(2):95-8.

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